O presente artigo se propõe a analisar a possibilidade de aplicação da Lei n.º 8.429/92 (Improbidade administrativa) aos chefes do Poder Executivo, dentro do que o Supremo Tribunal Federal –STF denominou de duplo regime sancionatório, tendo em vista que o Decreto-Lei n.º 201/67 que trata das infrações político-administrativas praticadas por prefeitos e a lei que trata dos crimes de responsabilidade dos governadores do Presidente da República, ministros, Governadores de Estados e secretários (Lei n.º 1.079/50), também tratam do assunto.
No direito brasileiro pairava a dúvida quanto à possibilidade de condenação dos chefes do Poder Executivo em razão do regime especial de responsabilização e, simultaneamente, por atos de improbidade administrativa nos termos da Lei n.º 8.429/92, a qual foi resolvida pelo Supremo Tribunal Federal primeiramente em relação à Lei n.º 1.079/50 e em 13 de setembro de 2019 em relação aos prefeitos quando julgou o Tema de repercussão geral n.º 576 e reconheceu a possibilidade de que os estes sejam processados e julgados por crime de responsabilidade e por atos de improbidade administrativa sem que haja impedimento em razão da independência de instâncias.¹
Nesse sentido, podemos então concluir que a jurisprudência pátria adotou, em regra, em relação aos agentes políticos o duplo regime sancionatório, sob o argumento de que se tratam de esferas independentes, já que uma se encontra na área cível e de responsabilidade política, ainda que, ao analisarmos as sanções impostas em ambos os casos verificamos que há sanções similares, a exemplo da perda da função pública.
No entanto, é importante verificar que nosso Supremo Tribunal Federal excepcionou desse regime duplo sancionatório o Presidente da República, isso porque ainda que o seu regime especial de responsabilização também esteja previsto na Lei n.º 1.079/50 inclusive no que diz respeito ao processamento e julgamento, o art. 85 da Constituição Federal elenca as condutas que podem ser enquadradas como crimes de responsabilidade praticados pelo Presidente da República. Assim, em razão da previsão de um regime jurídico próprio de responsabilização previsto constitucionalmente nossa corte maior entendeu pela impossibilidade de responsabilização referido chefe do Poder Executivo por atos de improbidade administrativa nos termos trazidos pela Lei n.º 8.429/92.
No entanto, há de se ressaltar que o fato do Presidente da República não poder ser responsabilidade pela prática dos atos de improbidade administrativa conforme descrito nos art. 9º, 10 e 11 da Lei n.º 8.429/92 não impede sua responsabilidade nos termos do art. 85, §5º, da Constituição Federal que elenca como crime de responsabilidade a violação da probidade administrativa.
Dessa forma, podemos então concluir, depois de uma análise dos pontos definidos pelo Supremo Tribunal Federal quanto ao duplo regime sancionatório imposto aos chefes do Poder Executivo, que tais agentes políticos devem obediência à probidade administrativa como princípio constitucional basilar do Estado Democrático de Direito, isso porque se encontra previsto em diversas passagens da Constituição Federal de 1988, seja como condição de inexigibilidade prevista em seu art. 14, dever do administrador público nos termos do art. 37 e crime de responsabilidade do Presidente da República, havendo diferenciações apenas quanto ao modo de responsabilização, em regra duplo e, excepcionalmente um regime especial único, mas em todos os casos prevendo a possibilidade de sanção em razão da improbidade administrativa.